Marcas na parede, organização de Hanna Liis-Baxter

Primeiro livro do tema "terror" e décimo segundo do ano do Desafio Literário 2012. A edição é da Andross, 2009 e tem 255 páginas. Troquei pelo Skoob, especialmente para ler este mês.

É uma coletânea de autores estreantes, ou com poucos livros e contos publicados, então não comecei a ler com expectativas elevadas. Mas me surpreendi, tem muita coisa boa. Infelizmente, a maioria das histórias tem  três páginas ou menos, então não chegam a "dar medo" ou assustar, porque o clímax é muito próximo da resolução e tudo acaba rápido, dando fôlego pra próxima história.

Acredito que o número de páginas tenha sido norma editorial e alguns autores não se saíram muito bem no resumo, mas isso é plenamente compreensível. Só teve um ou dois contos dos quais eu realmente não gostei, mas nem vou falar deles, já que, no geral, a coletânea é boa. Vou escolher alguns dos melhores contos (na minha opinião) pra comentar, dividindo um pouco por "estilo"

1. Contos da Cripta

Aquelas histórias meio humor, meio teatro de revista, meio non sense, meio pornochanchada e meio terror. Adoramos! Eu e a maioria dos fãs de terror, não é?

"Curso final para escritores de Terror" do Francis Piera, é uma delas. A história tem quatro páginas, acho que por isso é uma das melhores... deu "espaço" pra finalizar de forma bem decente. Duas amigas chegam numa "casa de madeira no alto de uma colina" para um curso de escritores. São recebidas por uma assessor que vai iluminando a sala, a princípio escura, com velas, sugerindo um clima muito propício. O ministrante do curso logo aparece e ele mesmo poderia ser confundido com um personagem dos quadrinhos da cripta. Após uma rápida palestra, os dois responsáveis pelo "curso" somem e as amigas ficam sozinhas na sala, e as velas se apagam num instante.
"Elas correram até a porta, mas esta fora trancada. Ao redor, cada item da decoração exótica parecia resmungar.
- Leca, o que está acontecendo aqui?
Escutaram passos do lado de fora. Passos pesados.
E arranhões. Dezenas deles."
"Mesmo que a morte nos separe", do João Affonso, também é assim. Um casal com um relacionamento meio conturbado, "mesmo que..."

2. Suspense, por Hitchcock

Lembram dessa série que passava na Globo, quando a gente era criança? Se seus pais te deixavam assistir, você vai entender o porquê dessa "categoria". São histórias sobrenaturais com finais surpreendentes (tcham tcham tcham tcham!!!)

E uma história que seria aprovada sem ressalvas pelo Hitchcock é "Monstro" da Luciana Apolloni Santana. Um grupo de colonizadores chega a um local na selva, uma aldeia abandonada e vazia, a não ser um pequeno menino que a narradora da história acolhe como filho. Todos começam a trabalhar, tentando melhorar as condições onde vivem para construir uma nova vida, esperançosos. Mas alguma coisa da floresta começa a atacá-los e fazer vítimas, em intervalos de tempo cada vez mais próximos.
"Os corpos apareciam dilacerados, como que atacados por ferozes mandíbulas. Quem, ou o quê, poderia ser responsável pelas mortes? E se não fosse uma fera ou um nativo, mas um de nós?
"Pequena ordinária" da Larissa Caruso tem um final perfeito, pra um conto tão curto. Encaixaria direitinho entre as histórias da série.

"Pra sempre a morte do cisne", de Nath Feerique e "Quem tem medo da loucura?" da Thaissa Ribeiro, também são no estilo e bem legais.

Em "Sentença final", do Célio Figueiredo, um executivo preso no engarrafamento aprende uma dura lição!

4. Amazing Stories

Esses contos fazem mais o estilo Steven Spielbierg, suspense, mas mesmo que alguém morra, o final é... feliz, ou quase. Pelo menos para um dos personagens...

"O poema de Anúbis", do Fernando Heinrich, sobre arqueólogos brasileiros que encontram blocos de arenito com inscrições antigas no Egito, é assim. Amazing.

Em "Encontros" do Rodrigo Zafra, o narrador encontra uma moça estranha numa boate, que não se deixa levar pelo ambiente e pela música. Perde ela de vista mas, quando resolve sair, a encontra chorando do lado de fora. E...

Seguindo um pouco a linha de "Encontros", em "A casa do fim da rua", da Cecília Torres Nogueira, um incauto transeunte se depara com uma história bem antiga...

"O piano" de André Catarinacho, é a história de um pai que queria encontrar a composição perfeita. A música mais bela de todas, a mais importante... mesmo que isso custasse sua própria saúde a de sua família...

5. A tradição

Enredos bem tradicionais, com um toque original, bem feitos.

"A folha em branco", de Georgette Silen. Durante um período de baixa inspiração, uma escritora se tranca em seu apartamento e passa a trabalhar apenas na máquina de escrever antiga, que parecia fazer fluir de seu teclado uma inspiração quase mágica. E então...

"Perdido na escuridão" do Luiz Ehlers: um casal sofre uma acidente numa noite chuvosa e o marido vai buscar ajuda em... uma casa "muito grande e velha". Compreenderam, não é?

"Espelho no corredor", da Ieda Silva Castaldi e "O quadro" de Amauri F. entram na lista por usar como protagonistas objetos terroríficos em si mesmos.

"A corrente do lobo", de Nathália Santa Rosa, traz o pai salvando as filhas de um lobisomem enfurecido pela lua cheia.

6. "Stephen Kingos"

Minha história preferida, "O presente de Camila" é a mais comprida, seis páginas e pouco e é um stephen kingo. Herói, problema, solução narrada em detalhes, final foda. Tem zumbis, pessoal que não aparece (muito) nas histórias do King, eu sei, mas o estilo, principalmente a forma de narrar, lembra bastante.


Outra história stephen kinga é "Miscigenação", de Jaqueline Leal. Tem um enredo bem interessante, mas... tem uma protagonista de nome "Runia" irmã de uma "Riana" (é senhor dos anéis ou história de terror?) A Runia conhece o "sobrinho" e o descreve como um bebê ainda cheio de "vérnix caseoso", seja lá o que for isso. Duas escolhas de palavras que distraem a atenção e tiram a empolgação da leitura...

Vérnix caseoso? Sério que você vai me fazer googlar pra descobrir o que é isso, editora?

Dois amores na mesma
foto!!!
7. Gaimanianos

"Assombração" do Victor Meloni, "Aprisionada", da Hanna Liis-Baxter, "O palhaço da rua treze", de Sóira Celestino e "A lenda da besta", de Polli Gomes, lembram o estilo de "sincretismo lendário" e um horror sem bem ou mal do mestre Gaiman.

Minha segunda história favorita também entra aqui. "Segredos de família" da Patricia Soares. Mei, filha de chineses, descobre, através de fotos, visões e sonhos, a história de seu nascimento. A história é ótima, mas faltou só uma ou duas frases para deixar mais claro o acontecido. Aí seria perfeita.

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Tem ainda algumas histórias que eu não citei, não exatamente por não ter gostado. Mas no geral, o livro é legal. Algumas histórias mereciam mais alguns parágrafos, uma página, talvez, para ficarem redondinhas. Pena terem resumido tanto.

Três estrelinhas e meia. Em cinco.


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Outras resenhas:

Noite e Dia, Virginia Woolf;
A melhor HQ de 1980;
Água para elefantes, Sara Gruen;
Buracos, Louis Sachar;
Preconceito Linguístico, Marcos Bagno;
O livro do contador de histórias chinês, Michael David Kwan
Oriente. Ocidente, Salman Rushdie
A jogadora de go, Shan Sa
Unhas, Paulo Wainberg
- A mulher do viajante no tempo, Audrey Niffenegger
Pinóquio, adaptação de Guilhaume Frolet
Clara dos Anjos, Lima Barreto
O rapto das cebolinhas, Maria Clara Machado
Cozinheiros Demais, Rex Stout

Comentários

  1. É como sempre digo: coletâneas de contos são lugares perfeitos para se conhecer novos autores. Acho que a categoria "Suspense, por Hitchcock" conversou mais comigo, é dos que prefiro; mas não me identifico taanto com as "Amazing Stories".

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    1. Eu gosto muito das "Amazing Stories", Luciano, porque o sobrenatural parece se encaixar melhor na história, fica quase natural que aquilo acontecesse, o enredo é mais fluido, menos tcham tcham tcham tcham!. De certa forma são as que dão até mais medo, porque se aproximam bastante da realidade...

      =P

      E eu gosto de coletâneas por isso mesmo, para conhecer outros autores. Mas coletâneas de estréia mexem com a minha vocação de agente literária... fico torcendo por eles! Espero que o pessoal tenha sucesso!

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  2. Coletâneas parece caixinha de surpresas. Eu as aprecio muito. Quas sempre consigo pescar alguma novidade literária bacana. Dica anotada!

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  3. Amei sua resenha e fico muito feliz em ter sido mencionada... Sua classificação do meu conto foi a mesma de um amigo que acabou de ler um livro que escrevi... E isso realmente chamou minha atenção... O curioso dessa história é que quando eu a escrevi, não tive a impressão de que ela fosse realmente assustadora... No entanto, no dia do lançamento, um ator selecionou meu conto para fazer a leitura dramatizada... Devo confessar que até eu senti medo do palhaço da rua treze... Obrigada pelo carinho e convido-a a conhecer uma antologia que organizei e que se chama Asgard A saga dos nove reinos... é uma antologia de contos sobre mitologia nórdica... O universo dos vikings e de seu panteão de deuses sendo os mais conhecidos: Odin, Thor e Loki... Beijos . Sóira Celestino

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    1. Oi Sóira! Realmente, a história, quando a gente lê, é de suspense, dá um pouquinho de medo no fim, mas o clima geral é como as histórias do Gaiman, meio tristes, meio filosóficas, um horror "justificado"... Mas interpretada por um ator, no capricho, deve ser assustadora! Muito obrigado pelo comentário e vou procurar o livro sim! Beijo!

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